A mãe era amiga da Dona Aurora e ia sempre à casa dela pra comprar farinha de milho e uns beijus, que eu adorava e ela sempre mandava uns bem grandões, e eu vivia pedindo pra conhecer o José. A resposta era sempre negativa, e eu ficava imaginando o porquê. Será que o José não gostava de criança? A gente sempre tinha que esperar na cozinha, sentado quietinho enquanto elas estavam no quarto dele.
Eu fui crescendo e um dia, sem ao menos esperar, a mãe me chamou:
_Vamos lá na Dona Aurora visitar o José?
Meu coração disparou de ansiedade. Como seria o José? Será q ele ia gostar de mim? A caminhada de poucos metros entre os dois sítios nunca me pareceu tão longa. Chegamos lá, a mãe me pegou pela mão e pediu se eu podia entrar no quarto com ela. Dona Aurora assentiu com a cabeça e entramos. Vi uma cama de madeira que parecia um berço grandão com grades altas, virado pra janela de onde se via o dia ensolarado. Minha ansiedade aumentou, me aproximei da cama e vi o José. Não esperava ver que ele era um adulto, que devia ter mais de 20 anos. Confesso que me assustei um pouco, pois achava que José era um tipo de bebê ou uma criança que gostava de ficar sozinha. Mas quando ele viu a mãe, abriu um sorriso e seus olhos brilharam. Era como se ele quisesse conversar, e respondia a cada palavra com um pequeno e esforçado gesto. Senti algo vindo do fundo da garganta que eu não sabia o que era, parecia que eu ia chorar.
José teve paralisia ainda bebê, e por isso ele era mantido no seu quartinho, sempre no seu berço e raramente saía pra ver o mundo de fora. No começo achei que era uma maldade deixar ele ali, isolado em seu berço, olhando constantemente pra uma janela aberta. Mas depois entendi que o que Dona Aurora fazia era proteger o seu bebê do preconceito e das estranhezas do mundo, e que pelo jeito que ele estava, amor e cuidado não lhe faltavam. Passei a gostar ainda mais dessa grande mulher, e dos beijus que ela me mandava com tanto carinho.
Até hoje não tenho mais notícias dele, mas sei que esteja onde estiver, foi uma das pessoas mais amadas e protegidas que eu já vi.
14 comentários:
Q linda essa história Charlie!
E fica ainda mais linda com a forma maravilhosa que vc escreve!
Such a cutie pie!
Acho que a mãe deveria dar mais oportunidades ao filho de conhecer o "mundo lá fora".
Talvez se esse mundo não fosse tão duro com as pessoas "diferentes", talvez se não houvesse tanta discriminação ou coisas do tipo.
Entendo, ela faz oq pode... e faz da melhor forma possível..
Belo texto! =)
Beijosss
Como julgar a Dona Aurora ou tentar entender até que ponto esse instinto protetor dela estava dentro dos limites? Acho que o sorriso que o José abria quando a via já tira todas as dúvidas que a gente pode ter quando começa a matutar sobre essa história. Belo texto, Charlie... como sempre!
Linda história, Charlie. Eu gosto muito da forma como você constrói suas personagens. A minha preferida é a sua mãe, mas eu já te disse isso!
Escreva mais, volte sempre que puder. Seus textos fazem um bem danado ;)
Beijos
Essa história foi a que eu mais gostei até agora. Mostra muito a realidade da nossa sociedade, em que o lema 'ser diferente é normal' não passa de um comercial bonitinho na TV. Mas, como privar um ser humano de conhecer o mundo? Não vou julgar D. Aurora, pois sei que como a maioria das mães suas decisões foram tomadas com muito amor.
Enfim, espero que o José tenha vivido no seu proprio mundo de um jeito muito bom, e com certeza repleto de cuidados e sentimentos positivos.
Beijos Charlie =)
só eu lembrei do filme "O jardim secreto" qdo li???
Oi Charlie, sou da equipe do Gengibre, e sei que você tem um perfil lá. Meio desatualizadinho, mas tá valendo.
Não sei se você ja viu, mas o Gengibre tem players bem legais, que você costumiza e coloca no seu blog.
Fica a dica, pra incrementar aqui =)
Que historia linda!
Que historia linda!
Que historia linda!
Que historia linda!
Que historia linda!
essa história me fez lembrar de quando eu era criança e o progresso começava a chegar no bairro em que cresci e ainda havia lá do outro lado da rua um dos últimos casarões da época dos barões. aquele corredor imenso (quando se é criança tudo é muito grande)de tábua corrida e aqueles vários cômodos. era a casa de Dona Natália. exatamente como uma casa grande [e era] onde ainda podia se ver no porão algum resquício de onde antes tinha sido uma senzala. e Dona Natália tinha um filho [agora não vou me lembrar o nome dele] que também teve paralisia quando criança, assim como o José. vivia sob as mesmas condições. Dona Aurora e Dona Natália. e eu muito criança tinha aquela curiosidade me perguntando sempre "porque?". coisa que só muito tempo depois fui entender. e assim como você um belo dia me levaram para vê-lo. hoje eu entendo.
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